segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Homenagem a Domenico Romano, o querido 'Seu Mimo' - uma vida dedicada ao futebol de mesa

Muito obrigado, seu Mimo!
(Crédito: Blog do Otacílio Neto)
O universo do futebol de mesa perdeu na última semana um de seus batalhadores mais abnegados: o italiano Domenico Romano, dono do Bazar e Papelaria Mimo. Ou, para quem o conheceu, apenas "Seu Mimo".

Seu Mimo deixou um legado de três décadas comprometidas com nosso esporte e fez da sua acanhada loja no centro de Porto Alegre a meca do jogo de botão. Comprar, vender ou trocar botões, ou mesmo treinar e disputar torneios, tudo convergia para aquela porta estreita na rua Fernando Machado.

Comecei a brincar e a gostar de botão ainda na tenra idade, quando fui apresentado aos disquinhos de plástico pelos amigos da vizinhança. Com o tempo descobri que havia uma infinidade de modelos, cores e tamanhos de botão, e todos eles podiam ser encontrados numa tal de "Mimo". Não demorou muito para que eu me tornasse um ávido frequentador daquela loja.

Passar as tardes na Mimo, depois da escola, era sempre uma diversão para mim e meus amigos. Lá podíamos revirar os baldes cheios até a tampa com botões usados, encontrar os tipos ideais para nossos times e fazer a troca, sempre no sistema de "2 por 1". Dois nossos por um da loja, claro. Dependendo da qualidade do botão pretendido, poderiam ser até três por um. E como valia a pena!

Escudinhos colados na tampa da
maleta do time de botão: um hábito!
A loja Mimo tinha mesmo de tudo: botões novos e usados, times personalizados, fichas, bolinhas, traves, maletas feitas sob medida. Mas nada me deixava mais hipnotizado que os escudinhos dos times. Ah, quanta nostalgia... Naquela época, início dos anos 1990, não havia computadores ou impressoras como hoje, e as cartelas com eram produzidas artesanalmente em serigrafia sobre papel adesivo. Mesmo assim, o catálogo da loja dava inveja a qualquer um: times do Brasil e do mundo inteiro bem ali, ao alcance de nossos dedos!

Foi vidrado em botão e escudinho que, ao longo da infância, montei esquadrões memoráveis - ainda que célebres apenas na minha memória. Santo André-SP, Novorizontino-SP, Bangu, Pelotas, Vasco, Botafogo... como se pode deduzir, sempre tive queda por times menosprezados.

A paixão pelo jogo de botão eu carreguei pelo resto da vida. Nunca me desfiz do plantel mais temível que formei quando criança: o Botafogo campeão brasileiro de 1995, com Túlio Maravilha jogando com a camisa 9 (no meu time, podia) e fazendo gol a torto e a direito. Claro que, ao longo do tempo, as responsabilidades da vida adulta tomaram o lugar do arrebatamento pueril, mas nunca o suplantaram. Tanto que me reencontrei com a modalidade, cerca de três anos atrás.

Botões comprados na Bazar Mimo nos anos 1990
Na busca por entusiastas em Campo Grande, em 2011 conheci dezenas de pessoas que, assim como eu, desenvolveram em suas infâncias o gosto pelo jogo. Várias delas ainda praticavam regularmente, para minha grata surpresa. A partir daí um grande grupo surgiu, cresceu e fez reacender aquela chama quase extinta pelo passar dos anos. Ao mesmo tempo, percebemos que não podíamos deixar o futebol de mesa cair no esquecimento outra vez. Era preciso criar algo perene, que fosse útil aos que viessem depois de nós. O ideal culminou em 2012 com uma federação estadual: fundada por seis clubes e moldada por mãos e mentes determinadas.

Em 2013, durante as férias, retornei a Porto Alegre depois de um longo hiato afastado da terra natal. Já na condição de presidente de federação, era imperioso que eu rendesse tributos à meca do esporte na capital gaúcha. Voltei ao Bazar Mimo para agradecer ao senhor Domenico.

Era uma tarde aprazível de outubro quando percorri uma vez mais as vielas do centro da cidade, tal como fazia duas décadas antes. A vitrine repleta de cores e flâmulas, os botonistas trocando peças entre si na porta da loja, tudo estava do mesmo jeito. Como sempre foi. Confiante, esgueirei-me entre os clientes no balcão e pedi para falar com o dono da loja. Seu Domenico prontamente me atendeu.

- Sei que o senhor não me conhece, mas frequentei sua loja durante muitos anos quando era criança. Foi aqui que surgiu minha paixão pelo jogo de botão, e foi daqui que eu levei essa paixão para todos os lugares onde estive. Hoje sou presidente da federação de Mato Grosso do Sul, e em grande medida devo isso ao senhor e à sua loja. Muito obrigado.

Quando estive na Bazar Mimo em 2013
Seu Mimo ouviu a tudo com atenção e sorriu alegre e um pouco sem jeito. Palavra nenhuma ele precisou dizer para expressar o quanto se sentia grato também. Estava claro em seu olhar brilhante de contentamento. Depois disso comprei alguns botões novos, nos despedimos e demos um último aperto de mão.

Regressei a Campo Grande feliz por ter contado àquele senhor de cabelos brancos o quanto seu trabalho de décadas significou na minha vida. Na minha e na de tantos outros amigos, colegas e parceiros de jornada pelo Brasil afora, todos unidos num mesmo ideal. Porque esse esporte é assim mesmo: não conta com grande reconhecimento do público nem com a atenção da mídia. Nem com as vultosas quantias dos patrocinadores, tampouco com a organização profissional das modalidades tradicionais. O futebol de mesa sobrevive graças à abnegação e à entrega de uns poucos, que se reconhecem uns nos outros e se dão forças para continuar. Seu Mimo se foi. Nós todos um dia iremos. O jogo de botão, nunca. Esse esporte é para sempre.

Hélder Rafael
Presidente - Federação de Futebol de Mesa de Mato Grosso do Sul (Fefumems)


Nosso esporte continua: estadual de equipes em Campo Grande

1 comentários:

Oi, bom dia. Sou a Mariana filha do Mimo e fico muito feliz com a homenagem prestada para meu pai. O bazar mimo permanece, mas de "cara nova", continuamos com o mesmo legado que o ele sempre cultivou. Quando voltar para Porto Alegre, ficaremos contentes em recebe-lo.
Muito obrigada,
Abraços.

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